Cena do filme "O Sétimo Selo", de Ingmar Bergman |
Rituais fúnebres sempre estiveram presentes em diversas culturas e a medida que cada sociedade apresentava aspectos culturais que promoviam disparidade entre tais rituais, estes eram indicativos de um espectro geral das crenças do grupo. Tais crenças seriam representativas de toda a esfera de concepções dessa cultura quando expandida. À sua maneira, cada cultura escrevia a história da relação do ser humano com a morte e assim criava uma estratégia a mais de enfrentamento. Sendo assim, para falar sobre a morte é preciso antes pensar na vida.
O fator cultural do morrer
A diferença no perceber do processo do morrer pelos povos é fator essencial para entender como os rituais se constroem em cada cultura. Na sociedade antiga, gregos apregoavam a imagem da morte ao Deus Tânatos, de olhos e cabelos prateados, Tânatos era uma personificação masculina e sombria do fim, conhecido por ter o coração de ferro, era o ceifador, enquanto Hades, deus do submundo, comandava o mundo para onde todos ao morrer iriam. O processo de morrer era considerado como uma descida aos reinos de Hades guiada pelas mãos da morte, o morrer era assim visto como um processo por onde a psykhê – a alma – deixava o corpo e se encaminhava pelo Rio Aqueronte ao mundo dos mortos, lúgubre estada eterna. Tal perspectiva fazia com que muitos temessem a morte e sonhassem com a vida eterna, todavia esta estaria garantida só para os deuses, sendo qualquer tentativa de um homem comum alcançar tal feito punida severamente. Enquanto que na crença dos antigos gregos – crença esta que influenciou em grande parte a cultura ocidental – se encontra uma visão soturna, para algumas religiões afro-brasileiras a morte não passa de mais uma transição – transições pelas quais o indivíduo passa em diversos momentos durante a sua existência – e assim, a morte não teria uma personificação como a ceifadora ocidental e nem seria em si o fim da existência do indivíduo, tampouco uma passagem onde uma natureza divina do ser humano – a alma – se dirige para um universo onde viverá eternamente, mas sim uma transformação natural e pacífica. Tais crenças influenciam como cada indivíduo entende o processo de morrer e lida com ele, assim, entende-se que quando a morte é vista de uma forma tenebrosa, o morrer pode vir a ser turbulento, enquanto que quando entendida como um processo natural, morrer pode ser muito mais tranqüilo.
Existem formas e formas de morrer.
A diferença no perceber do processo do morrer pelos povos é fator essencial para entender como os rituais se constroem em cada cultura. Na sociedade antiga, gregos apregoavam a imagem da morte ao Deus Tânatos, de olhos e cabelos prateados, Tânatos era uma personificação masculina e sombria do fim, conhecido por ter o coração de ferro, era o ceifador, enquanto Hades, deus do submundo, comandava o mundo para onde todos ao morrer iriam. O processo de morrer era considerado como uma descida aos reinos de Hades guiada pelas mãos da morte, o morrer era assim visto como um processo por onde a psykhê – a alma – deixava o corpo e se encaminhava pelo Rio Aqueronte ao mundo dos mortos, lúgubre estada eterna. Tal perspectiva fazia com que muitos temessem a morte e sonhassem com a vida eterna, todavia esta estaria garantida só para os deuses, sendo qualquer tentativa de um homem comum alcançar tal feito punida severamente. Enquanto que na crença dos antigos gregos – crença esta que influenciou em grande parte a cultura ocidental – se encontra uma visão soturna, para algumas religiões afro-brasileiras a morte não passa de mais uma transição – transições pelas quais o indivíduo passa em diversos momentos durante a sua existência – e assim, a morte não teria uma personificação como a ceifadora ocidental e nem seria em si o fim da existência do indivíduo, tampouco uma passagem onde uma natureza divina do ser humano – a alma – se dirige para um universo onde viverá eternamente, mas sim uma transformação natural e pacífica. Tais crenças influenciam como cada indivíduo entende o processo de morrer e lida com ele, assim, entende-se que quando a morte é vista de uma forma tenebrosa, o morrer pode vir a ser turbulento, enquanto que quando entendida como um processo natural, morrer pode ser muito mais tranqüilo.
Existem formas e formas de morrer.
Quando observamos os rituais de preparação para o morrer, é também possível encontrar algumas diferenças significativas. Por exemplo, na idade média a morte era vivenciada no seio familiar, de forma pública, vista como conseqüência natural da vida. Quando ocorria em uma cidade pequena, o sujeito era visitado por todos os seus conhecidos, fazendo com que o processo lento do morrer se tornar um evento social. E assim, saber que iria morrer era um aspecto essencial para uma boa transição, pois permitia a organização prévia deste evento. Já índios Tupis, para permitir essa boa transição e a paz eterna para o espírito dos que morriam, tinham o costume de enterrar seus mortos em casa, no mesmo lugar onde a rede destes ficavam. Promover uma boa transição é aspecto extremamente importante para os vivos, pois a despedida serve não só de ritual que ajuda a formalizar o luto, como de fator para a aceitação da morte, tranqüilização do indivíduo e dos seus familiares e de alívio da impotência sentida.
O ser humano é o único ser que tem consciência de sua finitude, mesmo assim (provavelmente por isso), não consegue a encarar como parte do cotidiano e consequência natural de estar vivo. Há uma tendência ao não pensamento na morte, um afastamento do âmbito pessoal, assim a morte acaba sendo vista em terceira pessoa, com uma sólida dificuldade em sua elaboração quando próxima. É possível relembrar as palavras de Max Weber ao falar que o homem moderno se angustia por ter um horizonte referencial definido pela ideia de progresso – com o tempo parecendo fluir linearmente para a infinitude – assim, morrer seria uma anomalia, extremamente indesejável por lhe parecer uma falha da natureza. Tais atitudes advêm de uma característica marcante na concepção do processo de morrer na cultura ocidental, o nosso tempo caracteriza-se por uma cultura que problematiza a morte. Negá-la é uma forma de não entrar em contato com esta dor que se supõe não haver como contornar.
A morte e os profissionais da saúde
Se lidar com a morte é extremamente difícil, para o profissional de saúde tal característica acaba por aumentar suas proporções, pois este a vê - pelo menos alguns tendem a ver dessa forma - como uma inimiga a ser vencida, tornando a irremediável ocasião de se perder um paciente em uma situação de derrota, impotência e fracasso. E tomando tal evento natural como seu rival, estes profissionais acabam por presenciar em seu ambiente de trabalho diariamente situações em que se tornam novamente os vencidos. Esse contato direto com a morte do outro traz à tona toda a fragilidade intrínseca do sujeito diante da sua própria finitude.
O cuidar em situações tão delicadas é para estes profissionais um sutil emaranhado de vivências com um elevado índice de estresse, onde estratégias de enfrentamento acabam sendo tomadas para que este profissional possa manter a sua saúde, tanto mental, quanto fisiológica, em equilíbrio. As habilidades desenvolvidas para o domínio das situações de estresse e adaptação a essas situações são denominadas coping. O coping é definido como todos os esforços de controle de uma situação estressora, ou seja, são respostas – comportamentais e/ou cognitivas – ao estresse com a finalidade de reduzir as suas características aversivas. O enfrentamento possui então duas funções que seriam consideradas as principais, a primeira seria o gerenciamento do evento estressor, tomando o problema como foco; a segunda seria o controle, redução ou até a eliminação das respostas emocionais ao evento estressor, mas ao focar apenas no embotamento, tal função teria características apenas paliativas. Percebe-se que há a necessidade de um preparo para atuar nesse campo, pois profissionais da saúde refletem a incapacidade de lidar com esse evento natural que já é enraizada em nossa civilização e dificilmente acabará. E esse preparo precisa estar na base da formação destes profissionais, guiado por teorias, técnicas e acompanhamento dos casos por psicólogos.
Por mais que o papel do psicólogo no hospital ainda esteja algumas vezes confuso para os graduandos - e mesmo para muitos profissionais formados - me parece que essa é uma boa opção de atuação, e, talvez, uma das mais necessitadas do conhecimento do psicólogo clínico e hospitalar. A morte de um paciente algumas vezes pode ser tão dolorosa quanto a morte de um amigo. E no meio de toda dor sentida, o profissional se percebe diante de uma dor que também é sua.
Se lidar com a morte é extremamente difícil, para o profissional de saúde tal característica acaba por aumentar suas proporções, pois este a vê - pelo menos alguns tendem a ver dessa forma - como uma inimiga a ser vencida, tornando a irremediável ocasião de se perder um paciente em uma situação de derrota, impotência e fracasso. E tomando tal evento natural como seu rival, estes profissionais acabam por presenciar em seu ambiente de trabalho diariamente situações em que se tornam novamente os vencidos. Esse contato direto com a morte do outro traz à tona toda a fragilidade intrínseca do sujeito diante da sua própria finitude.
O cuidar em situações tão delicadas é para estes profissionais um sutil emaranhado de vivências com um elevado índice de estresse, onde estratégias de enfrentamento acabam sendo tomadas para que este profissional possa manter a sua saúde, tanto mental, quanto fisiológica, em equilíbrio. As habilidades desenvolvidas para o domínio das situações de estresse e adaptação a essas situações são denominadas coping. O coping é definido como todos os esforços de controle de uma situação estressora, ou seja, são respostas – comportamentais e/ou cognitivas – ao estresse com a finalidade de reduzir as suas características aversivas. O enfrentamento possui então duas funções que seriam consideradas as principais, a primeira seria o gerenciamento do evento estressor, tomando o problema como foco; a segunda seria o controle, redução ou até a eliminação das respostas emocionais ao evento estressor, mas ao focar apenas no embotamento, tal função teria características apenas paliativas. Percebe-se que há a necessidade de um preparo para atuar nesse campo, pois profissionais da saúde refletem a incapacidade de lidar com esse evento natural que já é enraizada em nossa civilização e dificilmente acabará. E esse preparo precisa estar na base da formação destes profissionais, guiado por teorias, técnicas e acompanhamento dos casos por psicólogos.
Por mais que o papel do psicólogo no hospital ainda esteja algumas vezes confuso para os graduandos - e mesmo para muitos profissionais formados - me parece que essa é uma boa opção de atuação, e, talvez, uma das mais necessitadas do conhecimento do psicólogo clínico e hospitalar. A morte de um paciente algumas vezes pode ser tão dolorosa quanto a morte de um amigo. E no meio de toda dor sentida, o profissional se percebe diante de uma dor que também é sua.
Antoniazzi, A., Dell'Aglio, D., & Bandeira, D. (1998). O conceito de coping: uma revisão teórica Estudos de Psicologia (Natal), 3 (2), 273-294 DOI: 10.1590/S1413-294X1998000200006
Ariès, P. (2003). História da morte no ocidente. Rio de Janeiro: Ediouro
Kóvacs, M. J. (2003). Educação para a morte: Temas e Reflexões. São Paulo: Casa do Piscólogo
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